terça-feira, 16 de março de 2021

Outras tradições religiosas: A Volta dos Reis (1)

 Costumes relacionados com a religião, mesmo que tenham alguma parte não religiosa.

 

A Volta dos Reis   

É uma tradição religiosa que se perde nos tempos. Há uma lenda que se conta e, como em todas as lendas, não se sabe até que ponto corresponde ou não à verdade. Dizia-se que todos os anos, nestas terras, desaparecia uma rapariga donzela. A última terá sido uma jovem que foi à fonte buscar água e, sem se saber bem como, desapareceu sem deixar rasto. Procurada por todo o lado, nunca mais ninguém a viu.

Com a intenção de acabar com estes desaparecimentos misteriosos, o povo fez uma promessa: dar todos os anos, por altura da festa dos Reis Magos, a 6 de janeiro, uma volta pelas terras de onde já tinham desaparecido raparigas. A volta dos Reis, assim chamada, percorre, durante dois dias, várias localidades.

No primeiro dia: Sobreira, da freguesia de Pousafoles; Quinta da Retorta, da freguesia de Penalobo; Quinta do Clérigo, da freguesia de Águas Belas; Quarta-feira e Dirão da Rua, da freguesia de Sortelha.

No segundo dia: a volta inicia-se no Espinhal, depois, Vale Mourisco e, por fim, Águas Belas, aqui, na freguesia, a volta é dada depois da Missa dos Reis, com a santinha – é um quadro com a imagem de Nossa Senhora do Rosário – a assistir à missa, no seu altar.

Durante muitos anos eram três mordomos: um de Águas Belas, o mordomo da igreja; um de Vale Mourisco; e alternadamente um mordomo ou do Espinhal ou da Quinta do Clérigo. A certa altura, deixou de se poder contar com o mordomo de Vale Mourisco, passando a ser só dois os mordomos da volta, ainda que cada um leve um acompanhante. 

sexta-feira, 12 de março de 2021

A morte de alguém - acompanhamentos, alumiação e luto

 

Os acompanhamentos


Durante os cinco domingos, a seguir ao funeral, faziam os acompanhamentos. Antes da missa, ia-se à casa da pessoa e rezava-se lá dentro e cá fora. Rezava-se, também, ao fundo do povo e à porta da igreja.

Ao acompanhamento vinham, sobretudo, familiares ou amigos da pessoa falecida; mas também vinham pessoas só conhecidas, das aldeias vizinhas. No final da missa, rezava o senhor padre, e depois rezavam no alpendre, ao fundo do povo e junto da porta de casa.

Os acompanhamentos ainda hoje se fazem, mas já só se reza na igreja. Reza-se por todas as pessoas, até, pelas que morrem em França e lá são enterradas, desde que um familiar ou alguém próximo fale com o senhor padre.


Alumiar os defuntos


Ao fundo da igreja, naquela altura, não havia bancos, do lado direito, frente às escadas do coro, uma pessoa da família, ao início da missa punha velas a alumiar pela intenção da pessoa falecida. Usavam-se para isso uns suportes de madeira, com buracos apropriados para colocar as velas.

Se acontecia haver vários acompanhamentos, ao mesmo tempo, de cá e das anexas, da Quinta do Clérigo e do Espinhal, era uma quantidade grande velas a arder durante toda a missa. Este uso acabou, há muito tempo.

 

O luto


Havia um luto muito rigoroso, para toda a família, mas mais para as mulheres, vestiam-se todas de preto, até, de lenço e xaile na cabeça, nos primeiros tempos. Punham luto pelos pais, durante dois anos; pelos irmãos, um ano; pelos maridos e filhos, cinco anos ou mais, algumas, toda a vida.

Agora, têm-se do luto outro entendimento, cada um faz como acha melhor. 

 

terça-feira, 9 de março de 2021

A morte de alguém - o enterro, o pão da caridade e a novena

 

O enterro   

Em tempos mais antigos, o enterro era feito só com um senhor padre que ia a casa já com o acompanhamento, a cruz e as lanternas, fazer a primeiras orações; depois, o cortejo fúnebre dirigia-se para a igreja, era dita a missa e feita a última encomendação da alma já no cemitério.

Só quem tivesse possibilidades económicas pedia um enterro com ofícios; eram cerimónias diferentes. Vinham seis ou até mais senhores padres, celebravam os Ofícios, depois a missa e a seguir o enterro.

A partir de determinada altura, meados dos anos setenta, quando começou a haver mais possibilidades, quase todas as pessoas queriam que os seus familiares tivessem um enterro com Ofícios.

Agora, por falta de senhores padres, voltamos a ter enterros sem Ofícios. 

 

O pão da caridade

Nos anos sessenta, ainda, se distribuía, no dia do enterro, pão às pessoas presentes no acompanhamento. Chamavam-lhe o pão da caridade e a intenção era dar uma esmola pela alma da pessoa falecida.

Era partido às fatias, colocado em açafates de verga, guardado na casa de um vizinho e distribuído quando saia o funeral. Todas as pessoas tiravam uma fatia, beijavam o pão e guardavam-no ou davam-no a algum pobre que andasse a recolhê-lo; havia sempre pobres a recolher o pão.

  

A novena

No dia a seguir ao enterro, começa uma novena pela alma da pessoa falecida. Ainda hoje, se reza essa novena. Quase todas as pessoas vão ao terço dos mortais, pelo menos as que podem. Rezam-se na capela.

 

sábado, 6 de março de 2021

A morte de alguém - os sinais e o velório

 Em geral, as pessoas que morrem têm a consideração e a estima de toda a gente, o povo todo partilha a dor da família. Participam no velório, no funeral, nos terços e nos acompanhamentos.

 

Os sinais

Quando se ouvem sinais, toda a gente sai à porta: - quem é que morreu? Já morreu fulano?

Muitas vezes, já se esperava a morte de alguém, mas, outras vezes, não se está à espera de nenhuma morte. O toque a sinais é para se saber e para se rezar pela alma da pessoa que morreu.

 

O velório    

Antigamente, a pessoa era velada na sua casa[1], pelos familiares chegados ou mais afastados, por amigos e também pelas pessoas do povo. Ia-se deitar água benta e rezar, logo que fosse possível; voltava-se outras vezes e muitas pessoas passavam lá noite toda.

Mais tarde, os velórios passaram a ser na capela, no princípio, ainda se passava a noite; agora quase sempre são velados na igreja e à meia noite fecham a porta, que a família volta a reabrir, no outro dia, logo cedo.



[1]Por isso, as pessoas não faziam comida em suas casas, enquanto estivesse lá o mortal, havia sempre alguém de família que oferecia o comer.

quarta-feira, 3 de março de 2021

Calendário religioso - as procissões e os anjinhos

  

As procissões

As procissões tinham um grande sentido religioso e ainda têm. A primeira do ano era a do domingo de Ramos, depois a da Páscoa, a seguir a do Corpo de Deus e por fim a do Santo António, nos anos em que havia festa.

No dia das procissões, pelo menos, das mais importantes, as pessoas punham colchas nas janelas; colchas antigas, de seda, só de uma cor, amarela, vermelha e púrpura, ou com várias cores, em tons lilás ou avermelhados.

Já ninguém põe colchas às janelas, mas há pessoas que continuam a varrer e a enfeitar as ruas à porta das suas casas.

Os anjinhos

Muitas crianças eram vestidas de anjinhos para irem nas procissões, por promessas da família ou outra razão; todos de branco, com umas asas e uma coroa dourada, lá iam à frente da procissão, enfileirados. Há muitos que não se veem meninos vestidos de anjinhos nas procissões de cá.

sábado, 27 de fevereiro de 2021

Calendário religioso: Os Santos, o mês das Almas e o Natal

 

O dia de todos os santos

Todos os anos, no dia 1 de novembro, se faz a romagem ao cemitério. Nessa altura, só havia uma campa e algumas cruzes, as restantes sepulturas estavam, apenas, com duas pequenas pedras, ao cimo e ao fundo. No entanto, quase ninguém perdia de vista as campas dos seus familiares, cavavam-nas e compunham-nas, nesse dia, com carvalhas.

A romagem é um momento muito sentido, o senhor padre pede por todas as pessoas, pelos pais, pelas mães, pelos filhos, pelos jovens, pelos sepultados noutros cemitérios da freguesia, pelas almas do purgatório, por todos os falecidos...

Agora, há dois cemitérios, quase toda a gente tem campas, mas compõem tudo muito bem e com muitas flores naturais, carvalhas, crisântemos e outras, também, colocam velas a arder; algumas pessoas que vivem fora, nesta altura, vêm compor as campas e participar na romagem aos cemitérios.

 

O mês das Almas

Durante o mês de novembro, rezavam na igreja um terço pelas almas de todas as pessoas falecidas e almas do purgatório.

 

O Natal

No Natal, uns dias antes faz-se o presépio na igreja. Sabe-se que o culto ao Menino Jesus é muito antigo nesta igreja. Antes, as mordomas faziam o presépio com musgos, heras, um pinheiro e muitas imagens, algumas bastante antigas; faziam-no, aí, ao altar do Imaculado Coração de Maria.

Começava com a gruta, o Menino, Nossa Senhora e São José, e continuava com a representação da aldeia de Belém, com casas, ovelhas, pastores, artesãos..., o que podemos imaginar poderia existir numa aldeia daquele tempo.

Agora, fazem um presépio mais pequeno, ainda que estejam sempre presentes as imagens principais. 

 

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Calendário religioso: O mês de Nossa Senhora e o Sagrado Lausperene

  

O mês de Nossa Senhora

Durante o mês de maio, rezava-se na igreja o terço em honra de Nossa Senhora. Muitas pessoas chamavam-lhe o mês de Maria. Faziam-no à noite, porque durante o dia as pessoas trabalhavam.

O trono

Faziam um trono, um altar, de propósito, com vários degraus, forrados com um a pano branco e, por todo o lado, punham velas e vasos de flores. Muitas vezes, este trono era feito no altar do Imaculado Coração de Maria, mas também se fez no altar da Nossa Senhora do Rosário e da Senhora de Fátima.

Oferecer o ramo    

Em cada domingo, os meninos da catequese iam oferecer um ramo a Nossa Senhora. No final do terço, joelhavam-se junto ao altar, cantavam uns versinhos à Virgem e deixavam o raminho.

 

O sagrado Lausperene

Todos os anos, no dia 14 de outubro, é o dia do sagrado Lausperene. Durante vinte e quatro horas estava o Santíssimo exposto e de forma organizada, entre as pessoas de cá, as da Quinta do Clérigo e as do Espinhal, cantavam e rezavam durante essas horas todas. Continua a sua celebração, mas apenas umas horas, à tarde e ao início da noite, por causa de haver muito pouca gente.