terça-feira, 30 de junho de 2020

Animais domésticos - os porcos


 
Um porco  no cortelho
 

Os porcos

Eram parte indispensável da alimentação da família, durante todo o ano. Quase todas as pessoas compravam um porquinho pequeno, logo cedo, para o poderem criar, engordar e matar na próxima matança.
Os cortelhos dos porcos ficavam nos currais ou debaixo das varandas, onde fosse mais apropriado. Os porcos comiam os restos da alimentação: cascabulho, ervas, couves, botelhas, nabos..., o que houvesse; comem tudo. Faziam-se as “viandas” num caldeiro, envolvia-se tudo com farelo e deitava-se ao porco, normalmente, eram três viandas ao dia, mas também comiam braçados de couves e de erva, fora das viandas. Uns meses antes de ser morto, o porco era muito bem tratado, para engordar e dar uma boa matança. Chama-se “sevar” o porco.


sábado, 27 de junho de 2020

Animais domésticos - ovelhas e cabras

Um rebanho de ovelhas a pastar

As ovelhas

Só as pessoas com mais posses tinham rebanhos de ovelhas, com um pastor assoldadado só para o gado. No inverno, os rebanhos vinham dormir na corte, mas de verão ficavam nos campos, dormiam dentro de um bardo, uma espécie de quadrado, vedado, com cancelas, guardado por um cão. Junto ao bardo, ficava a choça para o pastor se abrigar, comer e dormir. As ovelhas davam lucro: vendiam-se os borreguinhos, faziam-se queijos do leite e, uma vez por ano, eram tosquiadas e a lã vendida a comerciantes que vinham cá comprá-la.
Cabras no campo

As cabras

Quem não podia ter vacas, tinha duas ou três cabras. Mesmo os que tinham vacas tinham cabras, atrás das vacas. Davam leite e cabritinhos; o leite bebia-se e faziam-se queijos; os cabritinhos, quase sempre, se vendiam para se poder fazer algum dinheiro que, por pouco que fosse, dava para algumas necessidades da casa. Não se comia carne a toda a hora, como agora; só pelas festas ou dias de nomeada se matava uma rês.


quinta-feira, 25 de junho de 2020

Animais domésticos - as burras


Uma burra no campo

As burras

A burra era o transporte dos pobres, como uma cestinha de mão, estava sempre pronta para qualquer serviço: ir ao mato, à comida do vivo, ao mercado do Sabugal, a comprar ou a vender qualquer coisa. Muitas pessoas, os garotinhos mais novos, mas também os mais velhos, quando iam longe a levar o vivo, iam e vinham a cavalo na burra.
Algumas andavam sempre aparelhadas, a albarda nunca lhes saía de cima. Outras, se os donos precisavam de trazer pouca coisa dos “chões”, andavam só com os alforges em cima. Quem não tinha vaca, até, lavrava com a burra; aqui, poucas lavravam, mas muitas puxavam carroças que levavam e traziam o que fosse preciso.
As burras, às vezes, emprenhavam e tinham crias. Vendiam-se os “burrecos” aos ciganos; durante muito tempo, eram eles que vendiam e compravam os burros, mesmo que se fosse ao mercado, lá estavam os ciganos, os mesmos que, também, vinham pelas portas a comprá-los e a vendê-los.

As o

terça-feira, 23 de junho de 2020

Animais domésticos - as vacas e o boi cobridor


 O vivo todos os dias saia para as pastagens, para tapadas com ervagens, lameiros e outros sítios, onde pudessem pastar, comer erva e outras plantas. 
Um bezerrinho a mamar na vaca 

As vacas

Talvez, a vaca fosse o animal de maior importância para a vida daquele tempo; quem podia, tinha uma, uma junta ou até mais. Uma vaca tinha todos os anos um bezerrinho para se vender, dava leite para fazer queijos, beber, fazer papas…, e ainda se podia trabalhar com ela. As vacas lavravam, semeavam os terrenos, tiravam as batatas, traziam para casa o que fosse preciso: lenha, feno, pão, palha, comida do vivo...
O pior é que nem todas as famílias podiam ter uma vaca, por não terem terras para a poderem sustentar, dava rendimento, mas precisava de comer bastante; quando se conseguia arrendar um baldio, uma tapada ou um lameiro e se podia comprar uma vaca, a vida daquela família começava a andar para a frente, melhorava logo.

O carro das vacas

Um barulho que recordo da minha infância é o do carro de vacas a passar, o barulho das rodas na calçada; agora um, depois outro, mais outro..., de manhã muito cedo e à tarde já quase noite, quando regressavam a casa, sobretudo, no verão (fenos, malhas, colheitas...). Havia carros de uma vaca e carros de duas. “Junguir” as vacas era pô-las ao carro, ao arado, à grade...


Boi no campo

O boi  cobridor

Quando as vacas andavam toirondas, tinham de ir ao boi, para emprenharem. Durante muitos anos, houve cá um boi que dava para as vacas de cá e da freguesia toda, era de um senhor chamado Álvaro. Estava sempre fechado na loja, não andava fora; era um boi grande, valente, para dar boa casta. Quando o deitavam às vacas, vinha sempre preso por uma corda, não fosse fugir; era lá no curral ou ali na rua que “tomava” a vaca. Quando já tinha feito o serviço, puxava-se outra vez pela corda e levava-se para a loja.
Depois, esse boi foi vendido, e cá nunca mais houve outro; tinha de se ir a Pousafoles, onde havia uns bois fortes, mais do que um. Pagava-se uma quantia ao dono do boi e se a vaca não emprenhasse à primeira, tinha de se voltar lá, mas já não se voltava a pagar. Era difícil ir com a vaca ao boi, quase sempre iam duas pessoas, o dono com a mulher ou um filho, algumas eram bravas, marravam, mesmo.
Mais tarde, as vacas passaram a emprenhar através de uma injeção, vinha cá um senhor, da parte do veterinário municipal (ou de outro serviço) e dava uma injeção à vaca. Tudo se foi perdendo, agora, cá quase já não há vacas.


domingo, 21 de junho de 2020

As malhas

Um mangual para  malhar o pão

As malhas

- E as malhas, como eram?
- Cada pessoa malhava o pão que colhia, só os ricos chamavam malhadores, porque tinham muito. Às vezes, andava-se a malhar dois ou mais dias para eles. Havia homens que andavam às malhas. Uma vez um dos meus irmãos, já depois de termos feito muitas malhas, chegou a casa e disse: - amanhã temos de ir malhar o pão do senhor…
Andava tão cansada que, estava sentada no banco da cozinha, comecei a chorar. No fim das malhas, andava já tão cansada, tão cansada!
- O que fazia nas malhas?
- Tirava a palha, andava à palha. Os malhadores colocavam os molhos virados com as espigas para o lado de dentro, era ali tudo cheio, não sei quantos molhos, mas muitos. Depois, iam malhá-los com o mangual; nem todos os homens sabiam malhar bem, era preciso um jeito.
Em geral, eram dois malhadores, de cada lado, a baterem, alternadamente, ora uns, ora outros; nas malhas grandes, podiam ser três ou quatro malhadores, de cada lado; conforme a laje dava, assim, se estendiam os molhos.
O grão, quando já era muito, puxava-se para o lado, com umas pás e varria-se; não se podia malhar em cima do grão, não se malhava bem. No final, o pão era todo limpo, mas tinha de haver vento; se não houvesse vento não se podia fazer aquele trabalho. Às vezes, estava-se mais de um dia à espera do vento, depois, com umas pás de madeira, levantava-se, o vento levava as palhas e o grão caia limpo na laje.
- E a comida nas malhas?
- Por essa altura das malhas, quase sempre os grandes lavradores matavam uma “rês” uma cabra ou uma ovelha, quase sempre uma ovelha, porque havia muitos rebanhos.
- A como iam, o que ganhavam?
- Ia-se ao dia, recebia-se em dinheiro ou em pão, um alqueire de pão, por um carro de pão malhado – já não sei bem se era assim.

O palheiro

A palha ou era atada, se as pessoas tinham onde guardá-la, ou se fazia um palheiro, lá na laje, feito de modo a não entrar a água; a palha estava todo o ano e não se estragava, só a de fora apodrecia um bocadinho.


As medas de pão

Laje da Reduta

As medas

Quando acabavam as ceifas, começava o tempo das malhas. O pão ia dos “rolheiros” para as lajes, transportado em carros de bois. Cada pessoa fazia a sua meda, a partir de uma base que se alargava conforme o pão que se tinha. Quem tinha muito pão, ficava com as medas largas e altas.

A meda era feita de tal maneira que podiam vir trovoadas fortes que não entrava a água no pão; a espiga sempre virada para baixo, molho sobre molho, recolhendo sempre um bocadinho, como nos telhados.

sábado, 13 de junho de 2020

As ceifas - os ranchos

A ceifa

As ceifas

Quando o pão estava maduro, com a palha bem seca, tinha de se ceifar. Os “ceifadores” iam deixando paveias de pão que depois outros homens atavam em molhos. Ao pão que se ceifava de uma vez, o que cabia numa mão, chamava-se gavela; três gavelas era uma paveia e três paveias era um molho; mas, às vezes, as paveias eram tão grandes que duas davam para um molho. O molho atava-se com as espigas todas para o mesmo lado.
Quando se terminava de ceifar um chão, acartavam-se os molhos para um rolheiro; o rolheiro era um entrançado de molhos, sempre com a espiga a descoberto, de maneira a que a chuva não entrasse para dentro. Os rolheiros ficavam nos campos, até à altura do pão ir para a laje.

Os ranchos

- Fale-me dos ranchos que andavam a ceifar pão.
- Eram ranchos de sete, oito, pessoas ou até mais, cada rancho tinha um “manajeiro”, um rapaz ou um homem, que era quem mandava, toda a gente lhe obedecia. Era quem resolvia as coisas, até as discussões, quando alguém começava a picar ou a discutir com outra pessoa, separava-as punha uma num sítio e a outra noutro, mesmo a dormir, não ficavam juntas para evitar as discussões.
Íamos até para terras de fora, para o Carvalhal, Quinta do Clérigo..., ganhava-se ao dia, às vezes, ajustava-se, mas no geral era ao dia. Ao nascer do sol, a essa hora, já se estava à porta dos patrões, para comer o almoço.
- O que é que comiam?
- Almoçava-se sopa, pão e vinho. Levava-se pão e queijo para o “cravelo”, ao meio da manhã, pelas nove, dez, horas; muitas vezes, já se levava, à cabeça, o “barranhão” das papas de milho, para se comerem ao jantar, punha-se lá a uma sombra e depois os patrões iam, à hora do jantar, com o resto da comida.
- E para beber?
- Havia sempre cântaros ou bilhas de barro para a água, o calor era muito, tinha-se de beber muita água. Ia-se a um poço ou a uma presa buscar água, mas, nem sempre havia, ou a gente não conhecia bem aqueles sítios e não se sabia aonde ir. Outras vezes, só se encontravam poços fundos, mas se fossem empedrados, as pedras serviam de escada e, de pedrinha em pedrinha, ia-se ao fundo do poço buscar água.
- Trabalhavam até que horas?
- Até à noite, mas, às vezes, estava quase a anoitecer e ainda havia ali um bocado bom para ceifar, já não dava para andar com aquela calma, tínhamos de acelerar para o acabar, então, o patrão dizia: - Se acabarem o pão até à ponta, ganham um cântaro de vinho doce.
Para ganhar o vinho doce, acabava-se já tarde. À noite, cantava-se e dançava-se, até às tantas, muitos não se lembravam que tinham de se levantar cedo no outro dia.
- O que era mais difícil nas ceifas?
- O mais difícil era o cansaço acumulado de uns dias para os outros. Também, quando o pão era pequenino, umas “peladinhas”, baixinho, fartava-se a gente de ceifar e ceifar para fazer um molho de pão; mas depois dava mais grão que um molho de palha grossa.
- E o pior?
- Nesse tempo, os homens ganhavam o dobro das mulheres, a não ser que fossem “galfarros” novos, de quinze ou dezasseis anos, esses rapazes ganhavam como as mulheres, ainda, não ganhavam como os homens.
- O que achava de os homens ganharem o dobro?
- Não achava bem, mas era assim; também, as mulheres ganhavam todas o mesmo e umas faziam o dobro das outras.
- Como é que andavam vestidas nas ceifas?
- Normal, com uma saia e umas meias grossas para não se picarem as pernas, de lenço e chapéu que o calor era muito; o avental punha-se para trás, para tapar as pernas, mas não era só nas ceifas, se tivéssemos de andar baixas, fazia-se isso, a pessoa ficava mais à vontade.


quarta-feira, 10 de junho de 2020

Trabalhos agrícolas - as regas



Trabalhos agrícolas


Falo de alguns dos trabalhos mais difíceis que por esse tempo se realizavam sem a ajuda de máquinas, como as regas, ceifas e as malhas.

As regas

Antigamente regar um chão de cultivo era um trabalho muito difícil, sobretudo, para quem não podia ter noras nos poços.

Os “burros”

Ainda há quem tenha, apenas, quando se precisa de regar muito pouca coisa. Era um engenho fácil de fazer e barato, bastavam dois paus com o formato adequado, um ferro e uma pedra; o problema era ter força para levar o balde até à altura da água e enchê-lo; para cima, vinha sem esforço; não era fácil manter um ritmo que desse para fazer um rego bom de água. Chama-se “ougar” água.

As noras

Em “chões” maiores, de agricultores que podiam comprar uma nora, tirar a água do poço, era menos custoso. Punha-se uma vaca à nora, um sistema de “copos” (pequenos baldes) que andavam sempre a rodar, enchiam quando desciam para baixo e despejavam quando estavam por cima; a água caia numa espécie de tabuleiro e era encaminhada para o rego. A nora fazia um bom rego de água, mas a vaca não podia parar, era preciso alguém sempre a tocá-la – muitas crianças faziam este trabalho: tocar a vaca à nora, enquanto a mãe ou o pai regavam.