terça-feira, 30 de março de 2021

Outras tradições religiosas - O Senhor dos Passos

 

O Senhor dos Passos

Eram muitas as pessoas daqui que todos os anos iam ao Senhor dos Passos, a Pousafoles. Talvez, não houvesse ninguém que tivesse ficado sem lá ir. São no domingo de Ramos; uma pessoa ou outra poderiam ir logo à missa, mas a maioria ia da parte da tarde, para ouvir os sermões que não podem começar cedo, porque o sermão do calvário tem de ser ao cair da noite. Ia-se em grupo, pelos caminhos antigos, quase sempre por pinhais.

O primeiro sermão da tarde era à porta da igreja. Caminhava-se, depois, em procissão, até ao sermão do encontro, Nosso Senhor encontra sua Mãe; a seguir, caminhava-se até ao sermão do calvário, a crucificação e morte de Jesus, depois, descia-se para a igreja e já lá dentro ouvia-se o sermão do enterro de Nosso Senhor. Muitas pessoas, não estavam ao último sermão, vinham logo que acabava o do calvário e já se fazia o caminho de noite.

Os sermões eram muito emotivos, as imagens também, tudo contribuía para se viverem umas horas de grande fé e religiosidade. Os Passos não eram uma festa, eram um momento solene, muitas pessoas estavam em recolhimento, até, sem vontade de falar.

 

 

 

 

 

 

 

sábado, 27 de março de 2021

Outras Tradições Religiosas - Encomendar as Almas

  

A encomendação das almas

Era uma tradição do período da Quaresma. Um grupo de pessoas, homens e mulheres, no geral, mais mulheres e as que sabiam cantar melhor, reuniam-se lá pela meia-noite e começavam a encomendar as almas, durante nove dias. Era a novena da encomendação das almas.

Cantavam orações próprias do tempo da Quaresma, cânticos da paixão, com uma letra e uma melodia que parecia quase um choro. Começavam na varanda do sino, depois, cantavam ao fundo e ao meio do povo e, ainda, à capela e ao calvário. Muitas pessoas já estavam na cama, não ouviam, mas outras punham-se a escutar aquele cantar triste, pelas almas dos defuntos. Alguns dos versos eram assim:

1.

Para além da sepultura

 no lugar da expiação

quanta dor quanta amargura

as almas sofrendo estão.

 

2. Oh misericordioso

 clementíssimo Jesus

dai-lhe o eterno descanso

o gozo da eterna luz.

 

3. Oh minha mãe bondosa

 para o purgatório olhai

 daquelas terríveis penas

 as almas libertai.

 

4. No céu entrarão

 as almas predestinadas

 libertas do mal

depois de purificadas.


terça-feira, 23 de março de 2021

As Janeiras - de Santo António e São Sebastião

 

Todos os anos se pediam as janeiras para Santo António e São Sebastião. Eram esmolas, dadas em géneros. Tinham esse nome, porque se realizavam, a seguir às matanças, até final de janeiro. Cá pediam-se estas duas, porque eram os Santos com mais despesa, um por causa da festa e o outro por causa da capela.

 

De Santo António

Os mordomos iam pedir a janeira. As pessoas davam produtos das matanças, chouriças, pés de porco..., mas, também, feijão, milho e até pão; davam do que colhiam e tinham em casa.

Havia quem fizesse de propósito uma chouriça maior, para dar a Santo António. Uma chouriça, dessas grandes, era como três ou quatro das pequenas; não era, sempre, assim, mas, às vezes, ou porque o porco adoecia, com uma febre ou outra coisa, prometiam dar uma chouriça, desta ou daquela medida, para ver se se curava.

No domingo a seguir, era a arrematação: os mordomos punham tudo, bem posto, na mesa das arrematações e quem queria, chegava-se à frente e oferecia uma certa quantia; vinha outro e cobria o lance, às vezes, assistia-se a um despique grande, entre quem estava interessado, era quando a janeira rendia mais; se já ninguém oferecia mais, arrematava-se, entregava-se a quem tivesse feito o último lance.

Costumava arrematar as janeiras, quem não matava o porco; às vezes, se o preço era bom, ficava-se bem, porque as coisas eram boas, as pessoas davam o melhor que tinham e toda a gente fazia os enchidos da mesma maneira.

 

De São Sebastião

Antes do dia 20 de janeiro, o mordomo pedia a janeira; as pessoas davam também coisas do porco e sementes, mas uma esmola menos avantajada do que para Santo António.

O mordomo reunia tudo, colocava a janeira no banco da capela ou numa mesa e no fim da missa arrematava-se; a maneira de arrematar era a mesma, levava a janeira quem desse mais.


sexta-feira, 19 de março de 2021

A Volta dos Reis (2)

 

A entrada de Nossa Senhora

A imagem de Nossa Senhora que percorria e ainda percorre as casas é um quadro que um dos mordomos leva ao pescoço, por cima de um pano de linho branco, uma toalha antiga.

Já se está à espera de Nossa Senhora, com a porta aberta e todas as pessoas da casa preparadas para a beijarem e receberem a bênção. Os mordomos começam a oração:

- Nossa Senhora entre nesta casa!

E as pessoas da casa respondem: - Nossa Senhora é quem cá queremos.

- Nossa Senhora lhes dê boas festas espirituais e temporais.

- E os senhores que tragam as mesmas.

Beija-se a Santinha, dá-se uma esmola e os mordomos deixam cigarros. Foi assim a promessa e essa tradição ainda hoje se cumpre.

As esmolas recolhidas, durante muito tempo, eram produtos agrícolas – feijão, milho, centeio, azeite… - mas, foram sendo diferentes conforme os tempos, agora, só dão dinheiro. Antes, o azeite servia para alumiar o Santíssimo Sacramento durante todo o ano; hoje as esmolas são entregues ao tesoureiro da igreja e destinam-se a despesas gerais.

terça-feira, 16 de março de 2021

Outras tradições religiosas: A Volta dos Reis (1)

 Costumes relacionados com a religião, mesmo que tenham alguma parte não religiosa.

 

A Volta dos Reis   

É uma tradição religiosa que se perde nos tempos. Há uma lenda que se conta e, como em todas as lendas, não se sabe até que ponto corresponde ou não à verdade. Dizia-se que todos os anos, nestas terras, desaparecia uma rapariga donzela. A última terá sido uma jovem que foi à fonte buscar água e, sem se saber bem como, desapareceu sem deixar rasto. Procurada por todo o lado, nunca mais ninguém a viu.

Com a intenção de acabar com estes desaparecimentos misteriosos, o povo fez uma promessa: dar todos os anos, por altura da festa dos Reis Magos, a 6 de janeiro, uma volta pelas terras de onde já tinham desaparecido raparigas. A volta dos Reis, assim chamada, percorre, durante dois dias, várias localidades.

No primeiro dia: Sobreira, da freguesia de Pousafoles; Quinta da Retorta, da freguesia de Penalobo; Quinta do Clérigo, da freguesia de Águas Belas; Quarta-feira e Dirão da Rua, da freguesia de Sortelha.

No segundo dia: a volta inicia-se no Espinhal, depois, Vale Mourisco e, por fim, Águas Belas, aqui, na freguesia, a volta é dada depois da Missa dos Reis, com a santinha – é um quadro com a imagem de Nossa Senhora do Rosário – a assistir à missa, no seu altar.

Durante muitos anos eram três mordomos: um de Águas Belas, o mordomo da igreja; um de Vale Mourisco; e alternadamente um mordomo ou do Espinhal ou da Quinta do Clérigo. A certa altura, deixou de se poder contar com o mordomo de Vale Mourisco, passando a ser só dois os mordomos da volta, ainda que cada um leve um acompanhante. 

sexta-feira, 12 de março de 2021

A morte de alguém - acompanhamentos, alumiação e luto

 

Os acompanhamentos


Durante os cinco domingos, a seguir ao funeral, faziam os acompanhamentos. Antes da missa, ia-se à casa da pessoa e rezava-se lá dentro e cá fora. Rezava-se, também, ao fundo do povo e à porta da igreja.

Ao acompanhamento vinham, sobretudo, familiares ou amigos da pessoa falecida; mas também vinham pessoas só conhecidas, das aldeias vizinhas. No final da missa, rezava o senhor padre, e depois rezavam no alpendre, ao fundo do povo e junto da porta de casa.

Os acompanhamentos ainda hoje se fazem, mas já só se reza na igreja. Reza-se por todas as pessoas, até, pelas que morrem em França e lá são enterradas, desde que um familiar ou alguém próximo fale com o senhor padre.


Alumiar os defuntos


Ao fundo da igreja, naquela altura, não havia bancos, do lado direito, frente às escadas do coro, uma pessoa da família, ao início da missa punha velas a alumiar pela intenção da pessoa falecida. Usavam-se para isso uns suportes de madeira, com buracos apropriados para colocar as velas.

Se acontecia haver vários acompanhamentos, ao mesmo tempo, de cá e das anexas, da Quinta do Clérigo e do Espinhal, era uma quantidade grande velas a arder durante toda a missa. Este uso acabou, há muito tempo.

 

O luto


Havia um luto muito rigoroso, para toda a família, mas mais para as mulheres, vestiam-se todas de preto, até, de lenço e xaile na cabeça, nos primeiros tempos. Punham luto pelos pais, durante dois anos; pelos irmãos, um ano; pelos maridos e filhos, cinco anos ou mais, algumas, toda a vida.

Agora, têm-se do luto outro entendimento, cada um faz como acha melhor. 

 

terça-feira, 9 de março de 2021

A morte de alguém - o enterro, o pão da caridade e a novena

 

O enterro   

Em tempos mais antigos, o enterro era feito só com um senhor padre que ia a casa já com o acompanhamento, a cruz e as lanternas, fazer a primeiras orações; depois, o cortejo fúnebre dirigia-se para a igreja, era dita a missa e feita a última encomendação da alma já no cemitério.

Só quem tivesse possibilidades económicas pedia um enterro com ofícios; eram cerimónias diferentes. Vinham seis ou até mais senhores padres, celebravam os Ofícios, depois a missa e a seguir o enterro.

A partir de determinada altura, meados dos anos setenta, quando começou a haver mais possibilidades, quase todas as pessoas queriam que os seus familiares tivessem um enterro com Ofícios.

Agora, por falta de senhores padres, voltamos a ter enterros sem Ofícios. 

 

O pão da caridade

Nos anos sessenta, ainda, se distribuía, no dia do enterro, pão às pessoas presentes no acompanhamento. Chamavam-lhe o pão da caridade e a intenção era dar uma esmola pela alma da pessoa falecida.

Era partido às fatias, colocado em açafates de verga, guardado na casa de um vizinho e distribuído quando saia o funeral. Todas as pessoas tiravam uma fatia, beijavam o pão e guardavam-no ou davam-no a algum pobre que andasse a recolhê-lo; havia sempre pobres a recolher o pão.

  

A novena

No dia a seguir ao enterro, começa uma novena pela alma da pessoa falecida. Ainda hoje, se reza essa novena. Quase todas as pessoas vão ao terço dos mortais, pelo menos as que podem. Rezam-se na capela.

 

sábado, 6 de março de 2021

A morte de alguém - os sinais e o velório

 Em geral, as pessoas que morrem têm a consideração e a estima de toda a gente, o povo todo partilha a dor da família. Participam no velório, no funeral, nos terços e nos acompanhamentos.

 

Os sinais

Quando se ouvem sinais, toda a gente sai à porta: - quem é que morreu? Já morreu fulano?

Muitas vezes, já se esperava a morte de alguém, mas, outras vezes, não se está à espera de nenhuma morte. O toque a sinais é para se saber e para se rezar pela alma da pessoa que morreu.

 

O velório    

Antigamente, a pessoa era velada na sua casa[1], pelos familiares chegados ou mais afastados, por amigos e também pelas pessoas do povo. Ia-se deitar água benta e rezar, logo que fosse possível; voltava-se outras vezes e muitas pessoas passavam lá noite toda.

Mais tarde, os velórios passaram a ser na capela, no princípio, ainda se passava a noite; agora quase sempre são velados na igreja e à meia noite fecham a porta, que a família volta a reabrir, no outro dia, logo cedo.



[1]Por isso, as pessoas não faziam comida em suas casas, enquanto estivesse lá o mortal, havia sempre alguém de família que oferecia o comer.

quarta-feira, 3 de março de 2021

Calendário religioso - as procissões e os anjinhos

  

As procissões

As procissões tinham um grande sentido religioso e ainda têm. A primeira do ano era a do domingo de Ramos, depois a da Páscoa, a seguir a do Corpo de Deus e por fim a do Santo António, nos anos em que havia festa.

No dia das procissões, pelo menos, das mais importantes, as pessoas punham colchas nas janelas; colchas antigas, de seda, só de uma cor, amarela, vermelha e púrpura, ou com várias cores, em tons lilás ou avermelhados.

Já ninguém põe colchas às janelas, mas há pessoas que continuam a varrer e a enfeitar as ruas à porta das suas casas.

Os anjinhos

Muitas crianças eram vestidas de anjinhos para irem nas procissões, por promessas da família ou outra razão; todos de branco, com umas asas e uma coroa dourada, lá iam à frente da procissão, enfileirados. Há muitos que não se veem meninos vestidos de anjinhos nas procissões de cá.