quinta-feira, 10 de junho de 2021

Tradições festivas - as «Bicas» e o dia da inspeção

  

As bicas

 

Sempre que uma jovem rapariga ficava noiva de um rapaz “de fora”, um rapaz que não fosse da terra, tinha de pagar as “bicas”. Era uma festa, havia quase sempre um baile e uma “borga”, comida e bebida para toda a malta. Eram os rapazes solteiros que iam pedir as bicas ao noivo. Também se dizia “pagar o vinho”, ouvia-se dizer: - já se vão casar, o rapaz já pagou o vinho.

 

O dia da inspeção

 

Iam à inspeção os rapazes da freguesia que, nesse ano, fizessem dezoito anos. Era um alvoroço nas terras, nesse dia, havia alegria e tristeza, ao mesmo tempo.

Os que ficavam apurados, não tinham razões para festejar, pois, a partir de 1961, a maioria, era quase certo, acabaria na guerra colonial, a não ser que pudessem ficar como “amparo de mãe”, se já não tivessem pai e fossem eles a trabalhar para o sustento da família. Os que ficavam livres, poucos, por terem algum problema de saúde ou não terem a capacidade física exigida, também sentiam também alguma tristeza, compreensível.

Ainda assim, quase sempre, a malta da inspeção ajustava um tocador e havia, logo que chegavam, uma ronda pelo povo, foguetes e um baile.

 

domingo, 6 de junho de 2021

Os bailes - a ronda, chamar as raparigas

 Os bailes

Havia bailes com concertina, em dias assinalados: Carnaval, Páscoa, São João, dia da inspeção militar, bicas, dias de festa e noutros dias; havia alturas, que todos os domingos havia baile. Havia cá dois tocadores, o senhor Aníbal e o senhor Clemente, mas também vinham tocadores de outras terras. 

Dançava-se ao fundo do povo, mas a maior parte das vezes, era no largo da capela, ao fundo das escadas do ti João da Costa ou atrás da capela.

 

A ronda

Nessa altura, os bailes eram à tarde e à noite. Quando chegava o tocador, os rapazes da malta davam logo umas voltas ao povo, a anunciar que o baile ia começar. Às vezes, podiam começar poucos, mas, no fim da ronda, era já uma “maltinha” grande; eram só rapazes, as raparigas não andavam à ronda. Nos dias de festa, havia sempre um foguete ou outro que alguém, dos da ronda, deitava.

 

Chamar as raparigas

Antigamente, os rapazes iam às casas, a seguir à ceia, chamar as raparigas para o baile. Se não as fossem chamar, os pais não as deixavam ir de noite, a não ser que tivessem irmãos mais velhos. Era uma espécie de responsabilidade:

- Deixa ir a sua filha para o baile?

. Deixo-a ir, porque tu a vieste chamar. Mas vê lá, não quero que aconteça nada de mal.

- Fique descansado.

Este uso acabou há muito tempo.

terça-feira, 1 de junho de 2021

Dias de Festa - A Romaria da Senhora da Póvoa (3)

 

As tendas

Havia de tudo a vender na Senhora da Póvoa; as tendas estavam por todo o lado, só ao pé da igreja é que não. Sempre se comprava qualquer coisa, para quem ficava em casa, sobretudo, para as crianças que estavam sempre à espera de amêndoas, uma pandeireta, um pífaro, um balão..., mas também se podiam comprar outras coisas, chapéus, calças, aventais, blusas, sapatos... No dia a seguir, havia sempre pessoas com coisas novas: “tens um chapéu bonito”! “Trouxeram-mo da Senhora da Póvoa”.

A romaria da Senhora da Póvoa continua, o recinto foi melhorado, fizeram um grande altar, há outro apoio para as pessoas, mas não tem, pelo menos, aqui no povo, o impacto que tinha. Era um acontecimento, não passava em branco. Quando se deixou de ir a pé e de burra, ia-se de excursão, numa camioneta. Agora, pouca gente já lá vai, os que vão, fazem-no em transporte próprio, já não em grupo e naquele espírito de romagem que existia dantes.

 

 

 

 

 

 

 

 

sexta-feira, 28 de maio de 2021

Dias de Festa - A romaria da Senhora da Póvoa (2)

 

O arraial

Depois da missa, ia-se comer o jantar, toda a gente levava uma merenda; depois do jantar, juntavam-se grupos, uns, cantavam à senhora da Póvoa, outros, começavam pequenos bailes.

 

As merendas

Cada pessoa levava o que entendia e o que podia: pão com queijo, chouriça, presunto..., um coelho assado ou guisado com batatas, bolos de bacalhau, doces..., o que cada um podia arranjar, porque a posses não eram as mesmas.

Ia-se para aqueles terrenos, logo do lado de fora do recinto, debaixo de uma oliveira ou num sítio que se encontrasse bom, estendia-se a toalha e comia-se. As pessoas estavam próximas umas das outras, podiam oferecer comida ou bebida, se fosse o caso, mas todas as famílias tinham a sua merenda.

 

Os cantares

Havia muitos grupos de cantadores, uns daqui e outros dali; juntavam-se, por terras ou por freguesias e começavam a cantar, algumas vezes, ao despique, versos à Senhora da Póvoa.

- Senhora da Póvoa/Nossa Senhora da Póvoa/ dizei-me onde morais/ ao fundo da serra de opa/ no meio dos olivais.

- Senhora da Póvoa/Nossa Senhora tão linda/ chegou a vossa nomeada/aos arrabaldes de Coimbra.

- Senhora da Póvoa/Nossa Senhora tão bela/ chegou a vossa nomeada à freguesia de Águas Belas.

- Refrão: Senhora da Póvoa/ Nossa Senhora da Póvoa/ viva a velha viva a nova/ viva a Senhora da Póvoa.

 

Os bailaricos

Havia também muitos bailaricos, com concertina, até. Quem queria e tinha vontade de se divertir, ia com outros rapazes e raparigas conviver um pouco.

 

terça-feira, 25 de maio de 2021

Dias de festa: A romaria à Senhora da Póvoa (1)

  Nessa altura, ir em romagem à Senhora da Póvoa, por promessa ou não, era um costume de muitas pessoas. Algumas iam todos os anos. Como todas as romarias, tinha uma parte religiosa e também uma parte de arraial e de diversão.

 

O caminho

Havia muita fé e devoção à Senhora da Póvoa; em horas de aflição muitas pessoas prometiam ir lá, no dia da festa, sempre, numa segunda-feira, do mês de maio. No domingo antes, grupos de raparigas e rapazes cantavam, pelas ruas do povo, à Senhora da Póvoa. Nesse dia, já passavam, por cá e por outros lados, grupos de romeiros, que cantavam e rezavam, pelo caminho.

Os grupos daqui abalavam no dia da festa, juntavam-se e iam a pé e nas burras, até lá. Tinham de abalar cedo, porque ainda são uns bons quilómetros, mesmo indo por caminhos antigos que encurtavam as distâncias, entre as terras. O santuário fica mesmo à saída da aldeia do Vale da Senhora da Póvoa, já do concelho de Penamacor.

 

A missa e as procissões

Há no recinto da Senhora da Póvoa uma igreja, mas no dia da festa, como havia muita gente, faziam uma missa campal, cá fora, junto ao coreto; havia um sermão e uma procissão ao redor do recinto.

À tarde, havia também uma procissão que levava o andor da Senhora da Póvoa para dentro da igreja, era como uma procissão do adeus.

Todas as pessoas visitavam a igreja, para rezar, deixar uma esmola e recolher “um santinho” com a imagem. Às vezes, até se levava uma esmola de uma pessoa que não tinha podido lá ir e trazia-se também uma imagem para ela.

 

sábado, 22 de maio de 2021

Dias de festa - A festa de Santo António (6)

 

Os bailes

Os bailes também faziam parte da festa, quase sempre, eram dois dias, domingo e segunda-feira. Havia um tocador ou até dois, um para cada dia. Começavam logo à tarde e iam pela noite dentro. No dia da festa, o baile era forte, toda a gente dançava, de cá e de fora, vinha gente de muito lado.

Primeiro, os bailes eram, quase sempre, no largo da capela, depois, passaram-se a fazer no largo da fonte velha, onde ainda se fazem; este espaço tem outras condições, um palco, um recinto arranjado, com bancos para as pessoas se sentarem.[1]

 

O jantar

Era um jantar de festa, com pratos típicos. A sopa era canja de galinha; depois, havia três pratos: cabrito ou borrego guisado, com batatas cozidas; carnes assadas (um bocado do cabrito ou do borrego, um coelho, um galo...) com batatas e “arroz-gordo”, feito com carne. Para a sobremesa usava-se o arroz-doce e a aletria; mais tarde, começaram-se a fazer os pudins. Por fim, vinham os doces (bolos secos, individuais), o pão leve, o bolo pardo e as filhoses.

Faziam-se grandes quantidades de tudo, sempre sobrava comida. Convidavam-se muitas pessoas, da família e dos amigos e, às vezes, apareciam poucas, à hora do jantar, embora, algumas passassem, à tarde – a mesa da festa ficava posta – e outras fossem à hora da ceia.

 

A segunda-feira de festa

Na segunda-feira, a festa continuava, da parte da manhã, havia missa na igreja, toda a gente ia, e a seguir a procissão que levava o andor de São Sebastião para a capela. À tarde e à noite, o baile.

 



[1]Na fonte velha, existem o bar (da Associação) e o Pavilhão Multiusos, feitos há poucos anos; embora separados do que são as festas podem dar algum tipo de apoio, se necessário.

domingo, 16 de maio de 2021

A festa de Santo António - os tabuleiros das ofertas (5)

Os tabuleiros das ofertas

Havia o uso de oferecer ofertas, um tabuleiro dos do pão, com doces, filhoses, carne assada, bebidas e outras coisas, o que as pessoas entendessem; colocavam as coisas de maneira a que o tabuleiro ficasse cheio e bonito.

Eram os mordomos que davam as ofertas, para eles era uma obrigação, mas havia outras pessoas que, por promessa ou porque queriam dar uma oferta melhorzinha, ofereciam, também, uma oferta para o Santo António, podia ser num tabuleiro pequeno ou num cestinho.

As ofertas ficavam cá fora, na mesa de pedra que está ao pé da igreja. Mas, quando saia a procissão, também iam a dar a volta ao povo. Eram levadas à cabeça, por uma rapariga que tivesse força, pudesse aguentar o peso e não a deixasse cair. Quando acabava a procissão, voltavam à mesma mesa, para serem arrematadas, uma a uma, no fim de tudo, na varanda do sino.

- Como é que se sabia o valor de uma oferta?

- Algumas pessoas davam um preço: “até este preço, fico com ela”. E ficavam; quase sempre eram os mordomos que arrematavam as próprias ofertas. Mas, podiam ser arrematadas por qualquer pessoa, de cá ou de fora, quem dava mais, levava a oferta. Às vezes, havia pessoas que vinham à festa e não tinham família onde comer o jantar, arrematavam uma oferta, comiam à vontade e ainda levavam para casa.

Havia muito brio nas ofertas; um brio bom, porque todos queriam que a sua não ficasse atrás das outras.